Bruxas e Feiticeiros

"Não permitirás que uma bruxa viva" diz o Exodus (xxii, 18). Esta e outras admoestações biblicas definiram as bruxas e prescreveram o seu destino. Uma bruxa ou feiticeiro é alguem em ligação com Stanás, o Mal, o espirito que se rebelou contra Deus.

Hoje é retratada como uma velha num vestido preto com um chapéu pontiagudo e montando uma vassoura à Lua Cheia. As crianças vestem-se assim no Carnaval ou no Halloween, para pena de alguns pios cristãos. Hollywood, por outro lado, conjurou imagens de mulheres sexy com poderes paranormais como psicocinética, controle da mente, e outros talentos ocultos. "Pagãos" ou religiões anti-cristãs da Nova Era são muitas vezes identificadas com bruxas e feiticeiros porque alguns cristãos pensam que praticam bruxarias ou porque algumas dessas religiões afirmam praticar mágicas ou "o trabalho." Alguns dos membros destes grupos referem-se a si mesmos como bruxas e warlocks (bruxas machos). Alguns auto-intitulam-se feiticeiros e adoram Satanás, i.e., acreditam em Satanás e fazem rituais que, pensam, os leva a partilharem dos poderes ocultos e sobrenaturais deste. Contudo, muitos dos bruxos e feiticeiros da Nova Era não adoram Satanás, e são associados com o oculto ou com tentativas de restabelecer religiões naturais que os seus membros associam a religiões antigas pagãs, como a céltica. Uma das mais espalhadas é a Wicca.

As bruxas da mitologia cristã eram conhecidas por terem sexo com Satanás e usar os seus poderes para fazer o mal. O culminar da mitologia da bruxaria ocorreu do século 15 ao 18 na descrição dos Sabbath. O Sabbath era uma farsa ritual da Missa. Bruxas e feiticeiros eram representados como voando em vassouras ou bodes, até ao Sabbath onde o Diabo (em várias formas) onde o Diabo representaria uma versão blafesma da Missa. Haveria danças obscenas, um banquete com poções feitas em caldeirões O banquete incluiria deliciosas criancinhas. A poção era usada para magoar ou matar pessoas ou para mutilar o gado. (de Givry, p. 83) Os iniciados recebiam uma marca fisica, como uma garra debaixo do olho esquerdo. O Diabo era representado como um bode ou um sátiro ou uma besta mitica com chifres, garras, cauda e/ou asas: uma farsa de anjo, meio homem meio besta. Um acto particular do Sabbath incluia o beijo ritual do traseiro do Diabo (de Givry, p. 87), aparentemente uma farsa ao tradicional acto cristão de submissão de ajoelhar e beijar a mão ou o anel do clérigo. Numerosos testemunhos de Sabbath estão registados. Por exemplo, uma pastora, Anne Jacqueline Coste, relatou no meio do século 17 que durante a noite de S. João ela e os seus acompanhantes ouviram um tremendo ruido e

olhando para todos os lados para ver de onde vinha pudemos ver sobre o monte, gatos, bodes, serpentes, dragões, e toda a espécie de impuros animais, que faziam o seu Sabbath e fazendo terrivel confusão, que diziam as mais sujas e sacrilegas palavras que se podem imaginar e enchendo o ar com as mais abomináveis blasfémias. (de Givry, p. 76)

Tais histórias foram contadas por séculos e eram aceites pelos pios cristãos sem um traço de duvida quanto à sua veracidade. Tais histórias eram consideradas exactas.

Pierre de l'Ancre, no seu livro sobre anjos, demónios e feiticeiros publicado em 1610, afirma ter assistido a um Sabbath. Eis a sua descrição:

Eis os convidados da Assembleia, tendo cada um atrás de si um demónio, e saibam que no banquete é apenas servido nada mais que a carne dos que foram enforcados, os corações de crianças não baptizadas, e outros estranhos e impuros animais, estranhos ao costume e uso do povo cristão, tudo sem dabor e sem sal.

As afirmações feitas em livros como o de l'Ancre e a descrição das actividades do Sabbath em obras de arte ao longo de anos não eram consideradas ficções humoristicas nem manifestações de espiritos perturbados. Essas noções, por absurdo que nos pareça, eram consideradas verdade por milhões de cristãos. O mais estranho é que muitas pessoas hoje acreditam em histórias semelhantes acerca de comer crianças e a morte ritual de animais, combinadas com abuso sexual e influências satanicas

Deixo aos Freudianos a interpretação destes persistentes mitos de criaturas satanicas com chifres, cauda, e grande apetite sexual; de raptos e abusos sexuais, mutilação e morte de crianças; de mulheres a esfregarem-se com unguentos e voando para relações como um bode demoniaco; e de poderes sobrenaturais como a metamorfose. O meu palpite é que a bruxaria e feitiçaria são parte da repressão sexual e servidos como justificação para o uso em arte e literatura, de pornografia criada, santificada e glorificada pela Igreja.

Certo que havia perseguições dos que mantinham uma ligação com o passado pagão. Mas é dificil de acreditar que as descrições das bruxarias saiam das vitimas torturadas e mutiladas e não das mentes dos seus torturadores. Os poderes dos inquisidores eram tão grandes, as suas torturas tão variadas e sádicas, que as vitimas acreditavam que estavam realmente possessas. As crueldades duraram séculos. A caça às bruxas só foi abolida em Inglaterra em 1682. A caça nos EUA teve o seu pico em 1692, em Salem, Massachusetts, onde dezanove bruxas foram enforcadas. A ultima execução judicial teve lugar na Polónia 1793. A ultima tentativa de execução teve lugar na Irlanda em 1900 quando dois camponeses tentaram queimar uma bruxa na sua lareira.(Smith, p. 295)

Quaisquer que sejam as bases psicológicas para a criação de uma anti-Igreja, o resultado prático foi uma Igreja mais forte e mais poderosa. Ninguem sabe quantas bruxas, heréticos ou feiticeiros foram torturados ou queimados pela Inquisição, mas o medo que criou afectou toda a Cristandade. Ser acusado de ser uma bruxa era igual a ser condenado. Negá-lo era provar a sua culpa: claro que uma bruxa dirá que não o é e que não acredita em bruxarias. Lancem-na ao rio! Se se afogar então não é uma bruxa; se nadar, então saberemos que é bruxa e que o Diabo a ajuda. Tirem-na da água e queimem-na, pois a Igreja não gosta de verter sangue! Na verdade, a Igreja criou um reino de terror superior em muitos aspectos aos de Estalin ou Hitler. Estes duraram apenas alguns anos e restringiram-se a territórios limitados; o da Igreja durou séculos e estendeu-se a toda a Cristandade. O terror da Igreja tambem se dirigiu em particular às mulheres. Não admira pois que as religiões actuais que se definem como pagãs e anti-cristãs se centrem nas mulheres. Não é estranho que as religiões da Nova Era exaltem o que a Igreja condenou (como o egoismo e a sexualidade saudável mesmo entre homossexuais) e condenem o que a Igreja exaltou (tal como a subserviência da mulher e a auto-negação). Quem os pode criticar?


Links

"SPIRITS, WITCHES, & SCIENCE: WHY THE RISE OF SCIENCE ENCOURAGED BELIEF IN THE SUPERNATURAL IN 17TH-CENTURY ENGLAND" por Richard Olson

Carus, Paul. The History of the Devil and the Idea of Evil (La Salle, Illinois: Open Court Publishing Company, 1974), reprodução da edição original de 1900.

de Givry, Grillot. Witchcraft, Magic & Alchemy, trad. J. Locke (New York: Dover Publications Inc., 1971), uma republicação da edição de Houghton Mifflin de 1931.

Hicks, Robert D. In Pursuit of Satan : the Police and the Occult (Buffalo, N.Y.: Prometheus Books, 1991).

Sagan, Carl. The Demon-Haunted World - Science as a Candle in the Dark, ch. 7 and ch. 24 "The Demon-Haunted World," (New York: Random House, 1995). O capitulo 24 é escrito com Ann Druyen e contem uma sinopse de Friedrich von Spee, Cautio Criminalis (Precautions for Prosecutors) (1631), que detalha os métodos irracionais e sádicos dos caçadores de bruxas.

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