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homeopatia

"A menos que as leis da química tenham enlouquecido, a maioria dos remédios homeopáticos é demasiado diluída para ter qualquer efeito fisiológico...."
-- Consumer Reports (Janeiro de 1987)

A homeopatia clássica teve origem no século 19 com Samuel Christian Friedrich Hahnemann (1755-1843) como alternativa às práticas médicas convencionais da época, como a flebotomia ou sangria. Abrir veias para o paciente sangrar, expulsar a doença do corpo e restaurar os humores a um equilíbrio adequado era uma prática médica popular até o fim do século 19 (Williams 2000: 265). Hahnemann rejeitou a idéia de que a doença deveria ser tratada expulsando o material ofensivo que a causava. Em vez disso, argumentava que doença deveria ser tratada ajudando-se a força vital a restaurar a harmonia e o equilíbrio do organismo. Rejeitava outras práticas médicas comuns em sua época como purgantes e eméticos "com ópio e calomelano feito com mercúrio" (ibid.: 145). Em retrospectiva, a medicina alternativa de Hahnemann era mais humana e tinha menor probabilidade de provocar danos que muitas das práticas convencionais da época.

A medicina científica estava se desenvolvendo nos tempos de Hahnemann, mas a homeopatia não iria fazer parte desse desenvolvimento. A medicina científica é essencialmente materialista. Baseia-se em disciplinas como anatomia, fisiologia e química. Embora os métodos de Hahnemann envolvessem a observação empírica, sua teoria sobre doença e cura é essencialmente não-empírica, e envolve o apelo a entidades e processos metafísicos.

Hahnemann divulgou suas idéias sobre doenças e tratamentos no Organon da Medicina Homeopática (1810) e em Teoria das Doenças Crônicas (1821). O termo 'homeopatia' é derivado de duas palavras gregas: homeo (semelhante) e pathos (sofrimento). Hahnemann tinha a intenção de contrastar seu método com a convenção da época de tentar equilibrar os "humores" tratando um distúrbio com o seu oposto (allos), e referia-se à prática convencional como alopatia. Embora a medicina científica moderna não conserve nada que lembre a teoria do equilíbrio dos humores, os homeopatas modernos e outros defensores da medicina "alternativa" chamam enganosamente os médicos convencionais de hoje de alopatas (Jarvis 1994).

A homeopatia clássica é geralmente definida como um sistema de tratamento médico baseado no uso de diminutas quantidades de remédios que, em grandes dosagens, produzem efeitos semelhante aos da doença que está sendo tratada. Hahnemann acreditava que doses bem pequenas de um medicamento poderiam ter efeitos curativos poderosos porque sua potência poderia ser afetada por uma agitação vigorosa e metódica (sucussão). Hahnemann chamava esse suposto aumento da potência através da agitação vigorosa de dinamização. Pensava que a sucussão poderia liberar "poderes imateriais e espirituais," tornando assim as substâncias mais ativas. "Alegava-se que bater de encontro a uma almofada de couro ou à palma da mão dobraria a diluição" (ibid.).

A dinamização era para Hahnemann o processo de liberação de uma energia que ele considerava essencialmente imaterial e espiritual. Com o passar do tempo, ficou cada vez mais impressionado com o poder da técnica que tinha descoberto, e fez advertências alarmantes sobre os perigos de se dinamizar remédios excessivamente. Isso poderia ter conseqüências graves ou mesmo fatais, e ele aconselhava os homeopatas a não carregar remédios nos bolsos dos coletes para evitar que inadvertidamente os tonassem excessivamente poderosos. Finalmente, chegou a alegar que não havia sequer a necessidade de que os pacientes engolissem os medicamentos. Seria suficiente que os cheirassem. (Campbell)

São usadas comumente duas escalas de potência: a decimal, que cresce em passos de 1:10, e a centesimal (1:100). Partindo-se da "tintura mãe" original (no caso de uma planta é um extrato alcoólico), faz-se uma diluição de 1:10 ou 1:100. Esta sofre sucussão e a solução resultante é chamada de primeira potência. Ela agora serve como ponto de partida para o próximo passo da diluição e sucussão, que resulta na segunda potência, e assim por diante. As potências de 1:10 são geralmente indicadas como x e as de 1:100 como c. Assim, Pulsatilla 6c significa a sexta potência centesimal de Pulsatilla, que recebeu seis sucussões e tem uma concentração de uma parte em um trilhão. (Campbell)

Como a maioria de seus contemporâneos, Hahnemann acreditava que a saúde era uma questão de equilíbrio e harmonia, mas para ele era a força vital, o espírito contido no corpo, que produziam o balanceamento e a harmonização, ou seja, a cura.

Hahnemann afirmava que a maioria das doenças crônicas era causada pelos miasmas, e que o pior deles era a 'psora'. As evidências em apoio da teoria dos miasmas, no então, são completamente inexistentes e ela parece ter sido resultado de algum tipo de revelação divina (Campbell). A palavra 'miasma'

vem do grego e significa algo como "mácula" ou "contaminação". Hahnemann supunha que as doenças crônicas resultavam da invasão do corpo por um dos miasmas através da pele. O primeiro sinal da doença é, portanto, sempre algum tipo de problema na pele (Campbell).

Seu método de tratamento poderia parecer bem moderno. Encontrar a droga certa para a doença. No entanto, seus remédios não eram elaborados para ajudar o organismo a combater a infecção ou a reconstruir tecidos, mas sim para ajudar o espírito vital a operar sua magia. De fato, Hahnemann acreditava que era "inerentemente impossível conhecer a natureza interior dos processos das doenças e que portanto seria inútil especular sobre elas ou embasar tratamentos em teorias" (Campbell). Seus remédios eram determinados pelos sintomas dos pacientes, não pela suposta doença que causava esses sintomas.

"leis" homeopáticas

Os homeopatas citam a "Lei dos Infinitesimais" e a "Lei dos Semelhantes" como a base para o uso de substâncias mínimas e para a crença de que semelhante cura semelhante, mas essas não são leis naturais da ciência. Se é que são leis, são leis metafísicas, isto é, crenças a respeito da natureza da realidade que seriam impossíveis de se testar por meios empíricos. As idéias de Hahnemann realmente tiveram origem em experiências. O fato de que ele tenha chegado a conclusões metafísicas a partir de eventos empíricos não torna, no entanto, essas idéias empiricamente testáveis. A lei dos infinitesimais parece ter sido parcialmente derivada de sua idéia de que qualquer remédio faria com que o paciente piorasse antes de melhorar, e que seria possível minimizar significativamente esse efeito negativo reduzindo-se a dosagem. A maioria dos críticos da homeopatia rejeita essa "lei" porque ela conduz a remédios tão diluídos que não possuem sequer uma única molécula da substância com a qual se começou.

Hahnemann chegou à sua Lei dos Semelhantes em 1790, ao traduzir o Materia Medica, de William Cullen, para o alemão (Loudon 1997: 94). Começou a experimentar várias substâncias em si mesmo, começando com a cinchona.

Diariamente, por vários dias, escreveu, ele tomou quatro oitavas da droga. A cada vez que repetia a dose, seus pés e pontas dos dedos se tornavam frios, e seguiam-se outros sintomas típicos da malária. A cada vez que parava de tomar a cinchona, retornava rapidamente a um estado de boa saúde (Williams 1981: 184)

Hahnemann experimentou diversas drogas em si mesmo por muitos anos, e concluiu que "um médico deveria usar apenas aqueles remédios que têm o poder de criar, num organismo sadio, sintomas semelhantes aos que poderiam ser observados na pessoa doente sendo tratada (ibid.)." Remédios devem ser administrados em dosagens únicas, ele afirmava, não em misturas complexas. Suas conclusões parecem ter sido baseadas em intuição ou revelação. Ele não fez experiências com os pacientes dando a eles drogas para descobrir quais remédios funcionavam com quais doenças, ou descobrir que apenas substâncias sem misturas eram eficazes. Na verdade, ele não podia fazer experiências com pessoas doentes porque assumia que os remédios tinham que produzir um efeito similar ao da doença, e ele nunca seria capaz de saber que remédios deveria usar porque os sintomas da doença seriam difíceis de distinguir dos do remédio numa pessoa doente. Em vez disso, assumiu que o que quer que causasse os sintomas numa pessoa sadia seria um remédio para a doença que tivesse sintomas semelhantes.

Hahnemann chamava esse método de descobrir que sintomas uma droga causava numa pessoa saudável de "prova".

Hahnemann não nos deixou nenhum detalhe sobre as doses que usou ou a forma de administrar as drogas, mas através de comentários casuais dispersos em seus escritos e a partir de relatos de seus poderes temos uma idéia bastante razoável do que acontecia. Todas as provas naquela época eram conduzidas com tinturas (extratos) de ervas ou, no caso de substâncias insolúveis, com 'primeiras triturações' (uma parte da substância triturada com nove partes de açúcar ou leite)....

Sua prática usual parece ter sido administrar doses repetidamente até que se produzisse algum efeito. A quantidade real era calculada com base na sua própria experiência anterior. Esperava-se dos provadores que registrassem seus sintomas com o máximo cuidado, e ao apresentarem seus cadernos de notas a Hahnemann, tinham de oferecer-lhe as mãos -- o modo costumeiro de fazer um juramento nas universidades alemãs da época -- e jurar que o haviam relatado era a verdade. Hahnemann então os questionaria detalhadamente sobre os sintomas, a fim de levantar os detalhes de tempos, fatores que os fizeram melhorar ou piorar, e assim por diante. Café, chá, vinho, brandy e temperos eram proibidos aos provadores, assim como o jogo de xadrez (que Hahnemann considerava muito excitante), mas a cerveja era permitida e exercícios moderados eram incentivados. (Campbell)

Trabalhando com o princípio das semelhanças, Hahnemann criou remédios para diversos distúrbios que tinham sintomas similares aos das substâncias que seus provadores tinham tomado. No entanto, ".... os métodos de prova são altamente personalizados e de relevância individual para o homeopata ou experimentador." * Em outras palavras, cem homeopatas preparando um remédio para um paciente poderiam muito bem chegar a cem diferentes remédios farmacêuticos.

Hahnemann pode ser elogiado por testar empiricamente seus remédios, mas seu método de teste é obviamente deficiente. Ele não estava realmente testando a eficácia dos remédios em pessoas doentes, mas sim seus efeitos em pessoas sadias. Em todo caso, teve de confiar nas avaliações subjetivas de seus provadores, todos eles seus discípulos ou membros da família, e todos os quais foram interrogados pelo próprio mestre. (Investigadores posteriores viriam a usar métodos de prova mais controlados. *) Mas mesmo se seus dados não fossem maculados pela possibilidade de que ele tivesse sugerido os sintomas aos provadores, ou que estes relatassem sintomas a fim de impressionar ou conquistar a aprovação do mestre, o que conecta essa lista de sintomas à cura de uma doença com sintomas semelhantes é uma crença em magia. Em lógica, esse tipo de salto na linha de raciocínio é chamado de non sequitur. Não se segue do fato que a droga A produza sintomas semelhantes à doença B que tomar A aliviará os sintomas de B. No entanto, os homeopatas aceitam a satisfação dos clientes com A como prova de que A funciona.

Há alguns indícios de que Hahnemann não tenha usado pacientes saudáveis para provar nenhum dos remédios que recomendava para a maioria das doenças: enxofre, tinta de polvo, sal e areia.

O que parece ter acontecido é que Hahnemann baseou suas novas provas, em grande parte, em sintomas que teriam sido apresentados por seus pacientes crônicos. Por suas próprias regras, esse procedimento seria inadmissível, e de fato isso o levou, sem dúvida, a atribuir ao efeito dos remédios numerosos sintomas que se deviam na verdade às doenças das quais os pacientes sofriam. (Campbell)

Embora possamos perdoar Hahnemann por não fazer experimentos adequadamente controlados, não devemos ser tão generosos com os homeopatas modernos por não compreenderem a natureza de evidências baseadas em testemunhos e relatos. Não podemos acusá-los de não executar nenhum experimento controlado projetado adequadamente. Mas podemos culpá-los por não compreenderem alguns dos princípios fundamentais da avaliação de resultados de experiências controladas que envolvem administrar drogas ou mesmo substâncias inertes a seres humanos.

Os homeopatas de hoje deveriam saber que, devido à complexidade de cada organismo humano individual, cinqüenta pessoas diferentes podem reagir de cinqüenta maneiras diferentes à mesma substância. Isso torna o ato de fazer testes clínicos de medicamentos em potencial um procedimento que raramente deveria reivindicar ter conseguido resultados impressionantes com base em um único conjunto de testes. A descoberta de uma diferença estatisticamente significativa, positiva ou negativa, entre um grupo experimental (terapia com drogas) e um grupo de controle em um único teste de uma droga deveria normalmente ser tratada com precaução. Assim como a não descoberta de nada estatisticamente significativo. Não é incomum que vinte testes de uma droga resultem em vários com resultado positivo, vários com negativo e vários com resultados mistos e inconclusivos.

Assim mesmo, apesar do fato de que entre as centenas de estudos realizados com remédios homeopáticos a grande maioria não tenha encontrado nenhum valor neles, alguns dos defensores da homeopatia não só insistem que os remédios funcionam, mas alegam saber como funcionam. Parece, no entanto, que cientistas como Jacques Benveniste, que alega saber como a homeopatia funciona, colocaram o carro na frente dos bois. Benveniste alega ter provado que os remédios homeopáticos funcionam alterando a estrutura da água, permitindo assim que ela retenha uma "lembrança" da estrutura da substância homeopática que foi diluída até deixar de existir (Nature Vol. 333, No. 6176, pp. 816-818, 30 de junho de 1988).* (Benveniste chega a afirmar que a atividade biológica de uma solução homeopática pode ser gravada digitalmente, armazenada num disco rígido, enviada pela Internet e transferida para a água no local de destino. Ele era um biólogo bem sucedido que trabalhava num laboratório estatal, até que começou a fazer afirmações desse tipo, o que lhe custou o status e a reputação de cientista respeitável. Atualmente é considerado pelos críticos (como James Randi) um segundo Blondlot. Como os remédios homeopáticos não funcionam, não existe a necessidade de uma teoria de como funcionam. O que é preciso é uma explicação para a razão de haver tantas pessoas satisfeitas com seus homeopatas, apesar de todas as evidências de que os remédios homeopáticos sejam ineficazes.

Por que alguém acredita que a homeopatia funciona?

Antes de tentarmos explicar por que tantas pessoas acreditam que a homeopatia funciona, defendamos primeiro a afirmação de que os remédios homeopatas são ineficazes. Há várias revisões de diversos estudos sobre a eficácia de tratamentos homeopáticos e nem sequer uma dessas revisões conclui que existam boas evidências de que qualquer remédio homeopático (RH) seja eficaz. Os homeopatas tiveram mais de 200 anos para demonstrar a eficácia do seu produto e fracassaram na tarefa. Certamente existem estudos isolados que descobriram diferenças significativas entre grupos tratados com um RH e os grupos de controle, mas ou nunca era possível reproduzi-los, ou os estudos eram desqualificados pelas falhas metodológicas. Duzentos anos e ainda esperamos por provas! Ter a mente aberta é uma coisa; esperar eternamente por evidências tem mais a ver com submissão aos desejos.

Terence Hines fez uma revisão de revisões dos estudos homeopáticos (2003: 360-362). Foram revistos Taylor et al. (2000), Wagner (1997), Sampson e London (1995), Kleijen, Knipschild e ter Riet (1991), e Hill e Doyon (1990). Mais de uma centena de estudos não conseguiram chegar a nenhuma conclusão positiva definitiva sobre as poções homeopáticas. Ramey (2000) observa que

A homeopatia foi assunto de pelo menos 12 revisões científicas, inclusive estudos meta-analíticos, publicados desde meados da década de 1980... [e] as conclusões são impressionantemente constantes.... "remédios" homeopáticos não são eficazes.

Assim mesmo, a homeopatia sempre terá seus defensores, a despeito da falta de provas de que seus remédios sejam eficazes. Por que? Uma das razões é o predomínio de uma compreensão equivocada das causas das doenças e como o corpo humano as encara. Hahnemann foi capaz de atrair seguidores porque parecia ser alguém que curava, em comparação com os que cortavam veias e usavam purgantes venenosos para equilibrar os humores. A maior parte de seus pacientes podem ter sobrevivido e se recuperado não porque ele os curou, mas porque não os infectou ou matou drenando um sangue de que precisavam ou enfraquecendo-os com venenos poderosos. Os remédios de Hahnemann eram, essencialmente, nada mais que líqüidos comuns e era pouco provável que eles, por si sós, fizessem mal. Ele não precisava que muitos de seus pacientes sobrevivessem e melhorassem para impressionar, em vista dos seus concorrentes. Se há algum efeito positivo sobre a saúde, não se deve ao remédio homeopático, que é inerte, mas aos próprios mecanismos curativos naturais do organismo ou à crença do paciente (efeito placebo), ou ao efeito que o estilo de atuação do homeopata tem sobre o paciente.

O stress pode piorar ou mesmo provocar doenças. Se um terapeuta tem um efeito calmante sobre o paciente, isso por si só pode resultar numa mudança significativa no sentimento de bem-estar da pessoa. E esse sentimento pode muito bem traduzir-se em efeitos fisiológicos benéficos. O método homeopático envolve passar muito tempo com cada paciente a fim de se obter uma lista completa de sintomas. É possível que isso tenha um efeito calmante significativo sobre alguns pacientes. Esse efeito poderia fortalecer os próprios mecanismos curativos do organismo em alguns casos. Como expõe o homeopata Anthony Campbell: "Uma consulta homeopática oferece ao paciente uma oportunidade de conversar longamente sobre seus problemas com um ouvinte atento e compreensivo num ambiente estruturado, e isso por si só é terapêutico." * Em outras palavras, a homeopatia é uma forma de psicoterapia.

.... a maioria dos homeopatas gosta de gastar pelo menos 45 minutos numa primeira consulta, e muitos preferem uma hora ou mais. Em segundo lugar, os pacientes sente que estão sendo tratados "como um indivíduo". Fazem a eles muitas perguntas sobre o que gostam e não gostam em matéria de comida, clima e coisas assim, muitas das quais não têm qualquer conexão óbvia com o problema que os levou à consulta. O homeopata, então, irá muito provavelmente consultar uma fonte de informação impressionantemente grande e imponente para ajudá-lo a escolher o "remédio" correto. (Campbell)

Sabemos que não há praticamente nenhuma evidência científica de que os remédios homeopáticos sejam eficazes. Isso não quer dizer que os pacientes não se sintam melhor depois de visitar um homeopata. Isso é outra questão, embora seja exatamente essa a razão de existirem clientes satisfeitos. (Sobre isso, o leitor poderia consultar os verbetes sobre o efeito placebo, a falácia post hoc e a falácia regressiva.)

Wendy Kaminer, crítica de diversos comportamentos irracionais, é um desses clientes satisfeitos. Mesmo assim, disse a seu homeopata que seu maior medo era "que alguém descobrisse que consultei um homeopata" (1999; p. 3), o que obviamente não é seu maior medo, ou ela não o teria anunciado ao mundo em seu livro.

Quando vou ao meu homeopata, talvez esteja seguindo uma das percepções do movimento de recuperação que eu sempre ridicularizei: Estou pensando com o coração e não com a cabeça. Ou talvez eu esteja agindo racionalmente afinal. Acreditar na homeopatia pode ser irracional, mas não usá-la se ela funciona seria ainda mais irracional. Só me importo se o remédio funciona, não por quê. (Tenho uma compreensão vaga sobre antibióticos).

Assim, não dou ouvidos a cientistas ávidos por me dizer que não é possível que os remédios homeopáticos funcionem porque violam as leis da química. Assumindo-se que os cientistas estejam certos, e que os remédios que eu tomei são meros placebos, por que iria eu começar a duvidar - e diminuir - sua eficácia? Por que não ser suscetível a placebos? (ibid.)

Neste caso, temos uma pessoa racional que deprecia o comportamento irracional e admite que faz uma coisa que muitas pessoas racionais considerariam irracional. É interessante como ela lidou com essa dissonância cognitiva. Ela tornou o irracional racional (ou ao menos menos irracional) concentrando-se na crença de que a homeopatia funciona. Mas sabemos que as poções não funcionam, então do que Kaminer está falando? Ela não está falando de estudos científicos que mostram que os remédios homeopáticos são eficazes, porque esses estudos apontam na direção contrária. De fato, ela não parece se preocupar nem mesmo se esses estudos existem. Ela quer dizer que acredita que "os remédios homeopáticos me ajudaram" (p. 4). Seu aviso ao leitor é não siga as minhas palavras, tente você mesmo, o que parece implicar que se formos a um homeopata e acharmos que isso nos ajudou, então seria irracional não continuar a visitá-lo. Mas o que realmente quer dizer ajuda ou ajudar? São palavras vazias. Não têm qualquer conteúdo cognitivo, embora sejam plenas de significado emotivo. A única concessão de Kaminer à idéia de que talvez esteja agindo irracionalmente é quando ela medita

.... talvez eu esteja imaginando que a homeopatia me ajudou. Talvez eu esteja confundindo correlação com causação: talvez eu tenha começado a me sentir melhor coincidentemente, por alguma razão desconhecida, ao mesmo tempo em que me voltei para a homeopatia (ibid., p. 4).

Ela nos aconselha a não seguir suas palavras e nos diz que devemos pedir que ela apresente provas do que afirma. Ela chega a nos aconselhar a tentar repetir sua experiência. Talvez seja essa a sua idéia do que uma pessoa racional e com mentalidade científica deveria fazer. Mas não há nenhuma forma de alguém substanciar sua alegação tentando duplicá-la. Não temos uma idéia clara o bastante da afirmação para sabermos o que estaríamos tentando substanciar. A alegação de que algo a ajudou é vaga demais para ser de qualquer valor na tentativa de duplicação. Será que ela está realmente dizendo que se eu for a um homeopata e me sentir melhor depois disso, então substanciei e dupliquei sua alegação? Acho que sim. E acho que ela está enganada.

Sim. Acho que entendo o que ela diz. Se eu, por exemplo, fui a um homeopata e descobri que sob o tratamento a dor nos meus joelhos desapareceu completamente, a dor que eu sinto há muitos anos e que meu médico diz que se deve à bursite, então eu seria irracional se não continuasse com os remédios homeopáticos. Além disso, seria irracional não consultar o homeopata quando eu começasse a sentir dor, digamos, nos cotovelos, ou nos ombros, ou nas costas. Se eu pudesse voltar a praticar corrida, seria irracional não continuar a ver meu homeopata. Eu poderia concordar. Mas se eu consultasse um homeopata a respeito de uma nova dor que meu médico foi incapaz de aliviar com uma terapia convencional e depois do tratamento homeopático a dor passasse, eu não consideraria irracional não continuar indo ao homeopata. Consideraria provável que a dor tivesse passado se eu não tivesse procurado o homeopata. (Se o leitor está imaginando por que, consulte o verbete sobre a falácia regressiva.)

Além do mais, se um remédio homeopático realmente curasse minha dor no joelho, eu iria querer investigar o que havia no remédio. Embora a maioria dos remédios homeopáticos nos EUA e Reino Unido não sejam mais que água ou álcool, há vários produtos no mercado rotulados como homeopáticos que contêm ingredientes ativos (veja homeopatia complexa, isopatia, e nosódios). No entanto, se eu descobrisse que o meu remédio era um daqueles tão diluídos tantas e tantas vezes que não restaria nenhuma molécula da substância ativa original, eu preferiria acreditar que a dor teria repentinamente desaparecido do que acreditar que o remédio homeopático a teria curado. Por que? Porque as leis conhecidas da física e química teriam de ser completamente reescritas se um tônico do qual foram removidas quase todas as moléculas do ingrediente ativo pudesse se demonstrar eficaz. Mas se eu pudesse fazer a dor ir e vir parando e recomeçando a tomar o remédio homeopático, teria de concluir que a poção estava fazendo efeito e teria de me tornar um defensor daquele remédio homeopático. Isso significa dizer que os remédios homeopáticos podem ser testados empiricamente. O fato de que nenhum desses remédios tenha até agora demonstrado fazer o efeito que descrevi é forte evidência contra eles.

Embora os remédios homeopáticos sejam ineficazes, a homeopatia em si é bastante eficaz, ou não teria sobrevivido e crescido nos últimos 200 anos. Ela é muito popular na Europa, especialmente na família real da Grã Bretanha. Há escolas de homeopatia em todo o mundo. Afirma-se que a homeopatia é uma indústria de 200 milhões de dólares por ano nos EUA. "O fato de que ela seja tachada de não-científica por alguns médicos ortodoxos é, para muitas pessoas, um mérito positivo, não uma crítica" (Campbell).

O principal dano causado pela homeopatia clássica provavelmente não vem de seus remédios, que são provavelmente seguros, mas ineficazes, embora isso esteja mudando à medida em que a homeopatia se torna indistinguível do herbalismo em alguns lugares. Um dos perigos em potencial é o incentivo ao auto-diagnóstico e tratamento. Outro perigo reside na atitude de não se receber tratamento adequado de um médico convencional nos casos em que o paciente poderia ser beneficiado por um tratamento como esse, como numa infecção de bexiga ou infecção por fungos, ou num câncer. A homeopatia poderia funcionar no sentido de ajudar algumas pessoas se sentirem melhor algumas vezes. Ela não funciona, porém, no sentido de explicar patologias ou suas curas numa forma que não só tenha conformidade com os dados, mas que prometa nos trazer uma maior compreensão da natureza da saúde e da doença.

Veja verbetes relacionados sobre medicina antroposófica, homeopatia complexa, isopatia, e nosódios.


leitura adicional

Barrett, Stephen e William T. Jarvis. editores. The Health Robbers: A Close Look at Quackery in America, (Amherst, N.Y.: Prometheus Books, 1993).

Barrett, Stephen e Kurt Butler (editores) A Consumers Guide to Alternative Medicine : A Close Look at Homeopathy, Acupuncture, Faith-Healing, and Other Unconventional Treatments; editado por (Buffalo, N.Y. : Prometheus Books, 1992).

Barrett, Stephen. "Homeopathy: Is It Medicine?," em The Hundredth Monkey and Other Paradigms of the Paranormal - A Skeptical Inquirer Collection, editor Kendrick Frazier (Buffalo, N.Y.: Prometheus Books, 1991), pp. 271-277.

Gardner, Martin. 1989. "Water with memory? The dilution affair." Skeptical Inquirer 12(2):132-141.

Hill C. e F. Doyon. "Review of randomized trials of homeopathy," Review d'epidemiologie et de Sante Publique, 38(2):139-47, 1990.

Hines, Terence. Pseudoscience and the Paranormal (Prometheus 2003).

Holmes, Oliver Wendell. "Homeopathy and Its Kindred Delusions," (do pai do grande jurista), 1842.

Jarvis, William."Homeopathy: A Position Statement by the National Council Against Health Fraud," Skeptic vol. 3, no. 1, 1994, pp. 50-57.

Kaminer, Wendy. Sleeping with Extra-Terrestrials (Pantheon Books, 1999).

Kleinjen J., P. Knipschild, e G. ter Reit. "Clinical trials of homeopathy." British Medical Journal. 302: 316-323, 1991.

Lessell, Colin B. The Infinitesimal Dose: The Scientific Roots of Homoeopathy (C.W. Daniel Company Ltd. 1995).

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Loudon, Irvine. editor Western Medicine: An Illustrated History, (Oxford University Press 1997).

Park, Robert L. Voodoo Science: The Road from Foolishness to Fraud  (Oxford U. Press, 2000).

Ramey, David W. "The Scientific Evidence on Homeopathy," Health Priorities, Volume 12, Número 1, 2000.

Raso, Jack. "Alternative" Healthcare: A Comprehensive Guide (Amherst, NY: Prometheus Books, 1994).

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Williams, Guy R. The Age of Miracles : Medicine and Surgery in the Nineteenth Century (Academy Chicago Publishers 1981).

©copyright 2003
Robert Todd Carroll

traduzido por
Ronaldo Cordeiro

Última atualização: 2004-04-03

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